MAD 30 ANOS DE LOUCURA
A REVISTA MAD COMPLETA TRÊS
DÊCADAS NO BRASIL E PARA COMEMORAR A DATA A WIZARD ENTREVISTOU O PRINCIPAL
RESPONSÁVEL POR TRÁS DESSE SUCESSO DURADOURO: OTA
*Marco Moretti e Levi
Trindade
A mais
duradoura publicação de humor do mercado brasileiro completou três décadas de
vida em julho. Isso mesmo, faz 30 anos que a Mad aportou em nosso País. Para contar um pouco dessa história,
que passou por editoras como Vecchi,
Record e, atualmente Mythos, nada
melhor que entrevistar o homem que é a “cara” da revista. Pensou em Alfred E.
Neuman? Errou. Amigo leitor, prepare-se, pois vem aí Otacílio D’Assunção
Barros, o Ota.
Wizard: De quem foi a feliz
ideia de trazer a revista Mad para o Brasil?
Ota: As pessoas pensam que a ideia foi
minha, mas na verdade quem trouxe a MAD pro Brasil foi o Lotário Vecchi ( o
dono da hoje extinta editora Vecchi ).
Foi ele quem fez o contato com Gaine ( nota: Bill M. Gaines, o criador da
revista nos E.U.A ) e comprou os direitos para lançar aqui. Antes disso, A MAD
esteve na mão de várias editoras, mas nenhuma quis lançar, achando que era
humor muito americano e não daria certo aqui no Brasil...Aliás,dentro da própria
Vecchi houve uma campanha interna
contra a publicação , ninguém além de mim, que era o editor de quadrinhos, e do
Lotário achava que a revista iria emplacar! Ele resolvia que revistas seriam
publicadas , e eu, o que saia dentro delas... Estava começando nessa área,
tinha só 20 anos na época. Quando a MAD finalmente saiu no Brasil, foi o maior
sucesso, em pouco tempo já estava perto dos 200 mil exemplares e calou aboca de
todo mundo. Algum tempo depois, as outras editoras começaram a lançar as
imitações!
Em 1974, quando a Mad brasileira
surgiu, estávamos no auge da ditadura militar. A revista passou por
dificuldades com relação à censura naquela época?
A MAD criticava
os costumes, não o regime. Não tinha censura oficial em cima, mas havia uma
certa censura interna dentro da editora. Tinha uma mulher que lia as fotonovelas
para ver o que podia sair...Ela mandou cortar, por exemplo um cena do número
dois, em que Serpico ( nota: o personagem-título do filme Serpico, interpretado
por Al Pacino, que foi satirizado nessa edição ) estava com uma mulher na
banheira. Mas a rigor foi só isso que aconteceu. Na reedição o quadrinho foi
colocado de volta. Fora isso, só mandavam amaciar algum palavrão, e expressões
como “babaca “, por exemplo, não podiam ser usadas na época.
As vezes o
Lotário se metia. Ele achou de mau gosto um quadrinho ( americano ) do Bob
Clarke no qual aparecia uma chave de fenda enfiada no traseiro do cara. Ficou “P”
da vida, e exigiu que um gerente passasse a ler tudo. Outra vez implicou com o
Nani e mandou cortá-lo por causa de um desenho em que apareciam um jogador de
futebol ( era o número da Copa ) enrabando o outro. Mas tinha uma tarja
censurando em cima. Mesmo assim ele ficou uma arara e mandou reimprimir a
edição.
Quem era o responsável pela
seleção do material?
Isso sempre
fui eu. Aliás, é o que faço até hoje. O critério era o que teria de graça aqui,
o que era americano demais era pulado. As sátiras eram escolhidas de acordo com
os filmes e seriados que estavam passando na época. Eu podia publicar qualquer
coisa que tivesse saído na MAD americana, então tinha 20 e tantos anos de
material para escolher à vontade.
Quando a MAD passou a publicar
trabalhos nacionais, os editores americanos exerceram algum tipo de controle?
Não. Sempre havia um conceito de que todas as edições
internacionais deveriam ter páginas locais. As daqui só começaram quando a
revista estava firmada e era um sucesso absoluto. O material nacional,
inclusive, passou a ser publicado para suprir a carência de páginas, pois a nossa
versão saia 12 vezes por ano, enquanto a americana somente oito. E da americana
uns 30% não se aproveitavam, porque eram seriados que não passavam aqui ou
coisas que só eram entendidas nos E.U.A. Foi por esse motivo que a revista
ficou 50% nacional, e é claro que eu adorei. Só houve problema uma vez, já na
segunda série da Record. Tinha
aquela capa do Planet Hemp em o Alfred E. Neuman estava cheirando cocaína por
um canudinho. Chegou uma carta apavorante dizendo que eles estavam chocados,
queriam explicações. Falaram que não podia ter o personagem cheirando cocaína
na capa. Por causa disso queriam que eu traduzisse tudo, achando que estávamos
fazendo apologia as drogas. Expliquei que Neuman não estava cheirando cocaína ,
mas sim maconha, e a piada era justamente essa, porque maconha não se cheira,
então estava “madisticamente correto“. Falei que a palavra droga aqui significa
não somente “entorpecente”, mas tem muito mais o sentido de “coisa ruim”, e que
o foco da edição era realmente esse. Então, eles responderam que estava tudo
bem, não precisava traduzir, e ficou por isso mesmo.
Esses trabalhos brazucas já
foram publicados em outros países?
Hum ... não.
Certa vez, conheci o editor da MAD alemã e nós chegamos a ensaiar uma permuta.
Ele gostou de uma matéria que eu tinha escrito e foi desenhada pelo Glauco
Cruz, mas disse que ia refazer a arte com desenhistas de lá. Em troca poderia
usar algo deles na nossa revista. Mas o
que saia aqui era sempre coisa muito específica do Brasil, acho que não faria
sentido em outro país.
Dos vários artistas e
roteiristas das diversas fases da MAD, quais seus
preferidos?
Sem dúvida,
o Vilmar Rodrigues, que já morreu. Ele inclusive foi o primeiro desenhista
nacional da MAD. Também gostava muito da Mariza Dias Costa e claro, sempre o E,
que ainda é colaborador até hoje. Eu gosto de trabalhar com o Tako X e o Luciano
( Félix ), que fazem as sátiras.
Qual a seção que você mais
curte? O Dave Berg, as piadas do Don Martin, o Spy VS Spy ou as piadinhas
marginais de Sergio Aragonés?
Curto todos
esses citados, você ainda esqueceu o Al Jafee. Mas o que mais gosto é o Relatório
Ota. Não é por ser eu que faço , aliás sempre que está ruim, pois faço com
pressa, mas quando releio, morro de rir, porque não imagino como alguém possa
escrever possa escrever tanta bobagem de uma vez. Ah e gosto muito Mário (Monroe)
do Bill Wray. E é claro o material jurássico do ( Harvey ) Kurtzman que é o
melhor de todos sem dúvida.
Como você explica a
longevidade da revista no Brasil?
Bom, realmente
é um fenômeno. Em edições internacionais, a MAD sempre foi bem em países de
língua anglo-saxônica, como Alemanha, Holanda, Dinamarca, Noruega, Suécia e finlandesa,
e fracassou retumbantemente nos países de língua latinas. Foi um fiasco na
Itália, na França, México e Argentina. Então, o Brasil é um fenômeno, porque é
o único país de língua latina onde a revista sobreviveu. Acho que o segredo é
como a adaptação foi conduzida . Modéstia a parte, não fiz um mal trabalho...
Houve alguma brincadeira
com leitores que gerou confusão do tipo retratação ou processo?
Não, os
leitores já escrevem sabendo que vão ser ridicularizados. Eles gostam de sair
na Galeria dos Babacas. Ser espinafrado na seção de cartas da MAD é símbolo de
status. Nunca houve nenhum processo, embora já tenha havido ameaças de
personalidades que foram satirizadas , mas elas desistiram antes de abrir os
processos.
O que é pior: uma pergunta
cretina ou uma resposta imbecil? Tirando essa é claro.
É para
responder essa mesmo?
*Colaboradores da Revista Wizard
Brasil- Ano 1- Número 11- Agosto de 2004